NA CAUDA DA REALIDADE...
SEM MEDO...
Prólogo
O medo domina-nos, tal como a fome. Temos sempre mais fome que vontade de ver...
«Esta ideia de dever, isto de solidariedade humana, só podia considerar-se natural se trouxesse consigo uma compensação egoísta...»
Fernando Pessoa
O Banqueiro Anarquista
Ed. Assírio & Alvim, pp. 34
Escolhi este trecho para finalizar a já longa série Na Cauda da Realidade, Sem Medo...
Desta feita tenho PULP a discorrer da aparelhagem, agora que já está tudo definido o ambiente musical quer-se que seja neutro, nada de emoções forte na hora da síntese. Esta deve ser feita calma e ponderadamente. Vamos lá então...
A série Na Cauda da Realidade evidencia somente o ser que eu sou, expus-me não tenho dúvidas, mostrei o que sou, aliás, despi-me completamente, sem medo. Esta série tem por trás um modo de ver as coisas que me é muito próprio que, normalmente, sintetizo com o nome de Relatividade Sistemática.
A noção de que tudo é sempre relativo em contraposição à existência do absoluto trás consequências drásticas, como demonstrei nos posts anteriores. A mais evidente é a queda da noção de deus pela sua base, deus como representado o absoluto. Depois outros temas tão caros como são a Moral ou o Amor. É a partir destes últimos conceitos que as sociedades são erigidas e por isso não é de admirar que qualquer tremelique nestes conceitos mexam tanto com as pessoas e levem a reacções muitas vezes ilógicas baseadas no medo do vazio tão evidente no Homem. Acho que demonstrei de forma mais ou menos convincentes (tantas arestas ficaram por limar, tantos pontos por explorar...) que a moral que conduz as pessoas, a noção de bem e de mal, são completamente relativas, o que quer dizer que poderão mudar conforme os pontos de vista. Atrever-me-ia a dizer que a Moral é uma consequência meramente religiosa-cultural. No entanto, se todos os membros de uma sociedade souberem que todos respeitam certos pressupostos morais todos sabem mais ou menos com o que contar, é um factor de segurança para todos. A verdade é que nem todos aqueles que compõem a sociedade estarão preparados para a abolição da ordem moral tal como ela é hpje apresentada, por isso esta noção fica restrita aqueles que conseguem distanciar-se do medo da perda dessa normalização moralista social para perceberem a sua quase completa inutilidade para o individuo.
O Amor é outra dessas falácias. O Amor é um sentimento muitas vezes visto como sendo quase transcendente, que tira forças ao céu para as entregar ao Homem. Mas se analisarmos bem ao que se resume o Amor será fácil de constatar que se abrevia a um acto meramente egoísta. Esta preposição será fácil de verificar com o exemplo que dei no capítulo Capítulo Terceiro-Tomo II dedicado à termodinâmica do Amor. Se o Amor fosse algo parecido com pureza o principio a=>b Ù b=>c <=> a=>c deveria ser sempre verdadeiro, ou seja, deveríamos amar a pessoa que faz a pessoa que amamos feliz. Obviamente isso quase nunca se verifica, porque o Amor absolutamente altruísta não se verifica, quando se ama alguém espera-se sempre algo em troca. Como é claro o retorno não será dado em coisas materiais, mas normalmente em fortalecimento da auto-estima, nem que seja pelo facto de sabermos que existe alguém que gosta de nós, apesar de todos os nossos defeitos.
Como já devem ter reparado todos estas ideias enquadram-se num movimento já existente e com o qual me identifico de sobremaneira: O Existencialismo.
É claro que se isto que digo tiver o mínimo de fundamento exclamarão todos as palavras já enunciadas por Jean Paul Satre: «Se Deus morreu, então tudo é permitido.» É aqui que reside o medo dos Homens ao sequer pensar na veracidade das ideias anteriormente expostas. No entanto houve alguém que em 1772 dava já a direcção para a resolução desta questão, Barão D’Holbach, o padroeiro deste blog. Na altura dizia ele: «Pergunta-se que motivos poderá ter um ateu» (nos dias de hoje D’Holbach converteria ateu em existencialista concerteza) «para fazer o bem. A vontade de dar satisfação a si e aos outros; de viver feliz e em paz; de conquistar o afecto e estima dos homens, cuja existência é muito mais certa e cujas disposições se podem conhecer muito melhor do que as de um ser incognoscível por natureza» (D’Holbach, Good Sense [1772]). Uns anos mais tarde Heger conseguiu clarificar esta vontade, chamou-lhe qualquer coisa como Reconhecimento. O que guia a vontade humana será o reconhecimento pelos seus pares.
Finaliza aqui a série Na Cauda da Realidade, Sem Medo que, confesso, me deu tanto gozo pô-la cá para fora. Tenho mesmo de confessar, que foi a vontade de partilhar estas ideias, precisamente estas ideias, que está na génese deste blog. Este objectivo está concretizado, mas descobri entretanto que o blog serve para nos conhecer melhor, por isso vou continuar. Quando descobrir novas máximas,... logo vos direi...