pensamentos correntes, pensamentos pendentes

segunda-feira, dezembro 29, 2003

|

Antropologia do Blog
Chegou a altura de pensamento não tão metafísicos.
Estava eu um dia destes por aí e veio-me a ideia de criar outro blog para escrever de uma outra maneira que não se adequaria a este. Um outro blog onde colocaria pensamentos mais coloquiais e depois pensei: Para quê? – Pensei eu. A resposta foi óbvia: Para nada. Este blog é meu. Representa em parte aquilo que eu sou e por isso mesmo é aqui que vou colocar os alguns dos meus pensamentos e é por isso a razão para não criar outro blog mais adequada a outro tipo de pensamentos.

Esta questão da criação de um novo blog despontou em mim uma outra questão. Porque é que as pessoas escrevem blogs? Porque é que de repente houve uma adesão maciça a esta coisa dos blogs? Já antes não tínhamos todas estas coisas para dizer? Porque só agora este rebentar de uma onda escrita criativa?
Pois bem, eu tenho uma teoria.
Todos nós temos a necessidade de sermos reconhecidos. Todos nós pensamos que aquilo que pensamos é que está certo e é por isso (e por vezes por boa educação) é que aturamos os pensamentos dos outros, mesmo sabendo que estão impregnados de burrice. É no meio desta conjuntura que surge o blog. O blog é a oportunidade que nós temos presentemente para expor as nossas ideias, mesmo que sejam aquelas que vivem submersas nas trevas do nosso pensamento, e de ter a esperança de serem lidas por alguém. E mais, que entre as pessoas que possam ler os nossos blogs (que na maioria das vezes são as pessoas nossas conhecidas, pois todas as outras pessoas não sabem da existência do nosso blog, só aquelas a quem demos o endereço), tendam a concordar connosco.
Todos nós estávamos fartos de um monte de papel escrito fechado numa gaveta esquecida com os nossos pensamentos mais reais, no entanto ali a possibilidade de alguém os ler era ainda mais diminuta que estando esses pensamentos num blog.
Assim o blog surge como uma nova liberdade. È a liberdade de darmos ao mundo os nossos pensamentos (gratuitamente, o que nos dias de hoje é coisa rara). O blog representa a possibilidade de pormos cá fora aquilo que por vezes nos sufoca por dentro. E, apesar de os blogs serem anónimos, nós conhecemos as pessoas que estão por trás daquela escrita. Por vezes esquecemo-nos, mas não é só o nome que define uma pessoa, aliás o nome é o que caracteriza menos uma pessoa, nós é que estamos habituados a associar um nome a uma pessoa. Mas a pessoa é muito mais que isso. A pessoa é, basicamente, aquilo que sente. É a partir daí que o resto se processa. As atitudes que uma pessoa tem ao longo da vida vem dos sentimos que se encontram no seu interior. Quantas vezes pensamos – “Não deveria ter feito aquilo...” – mas na verdade é aquela atitude que nos caracteriza, que faz de nós a pessoa que somos. É desta forma que conhecemos outras pessoas através dos blogs. Companheiros de pensamento, de dúvidas eternas de angústias existenciais. E por isso que eu exulto um viva aos blogs e a esta nova forma de comunicação.

VIVAM OS BLOGS.

sexta-feira, dezembro 26, 2003

|

Hoje é altura da pensamentos contemporâneos
Sim e mais uma vez é altura da falar no natal. É normal para mim ficar sempre um pouco irritadiço por esta altura. Por vezes penso que é devido a todo o stress induzido por esta época. Toda a pressão para fazer compras para todos. Depois há sempre alguém que nós não contava-mos que nos oferece uma prenda, e lá temos que ir a correr comprar um presente de para devolver a delicadeza.

Outra razão para esta irritação crónica poderia ser a inevitabilidade do fim de mais um ano. É engraçada esta noção de ciclo. Um ano é um ciclo imposto pela Natureza ao Homem e ao qual o Homem se sujeita. É por isso que fazemos as coisas acompanhar esse mesmo ciclo. Com o encerramento do ano também se encerram ciclos da nossa vida profissional, emocional, etc. É comum pensar: “A partir do próximo ano tudo será diferente, vou ser muito melhor, vou fazer muito melhor...”. Mas depois o que acontece?... Nada, simplesmente nada. Porque somos assim e é precisa uma força enorme para mudar, e por vezes não compreendemos que não possuímos essa força. Por outras vezes temos a consciência que temos essa força em nós mas achamos que não vale a pena o sacrifício.
Apesar de todos estes factores poderem contribui ( e estou certo que contribuem de certa forma) acho que a razão principal para a minha fúria nesta altura é outra, e é tão evidente.

É neste espaço temporal que me dou conta de uma forma mais evidente que nos andamos sempre a enganar. O que me acirra profundamente é a cegueira que nos invade a todos, é nos enganarmos a nós próprios. E por vezes, nas piores alturas, vejo e sinto que as pessoas não se dão conta que estão cegas. Estão tão certas de ver, além do mais afirmam que vêem, não admitem que se diga o contrário. É assim, que todos nós desejamos a todos os que nos rodeiam um Bom Natal, Boas Festas, Um Ano Novo Cheio de Tudo de Bom.

É claro que a desgraça inerente à existência do mundo não se altera, mas por esta altura, por breves momentos vem ao de cima mais intensamente para nosso “bel” prazer. Sim, a comoção completamente hipócrita que sentimos ao olhar para o jantar dos sem abrigo oferecido por uma entidade estatal qualquer é condição essencial para que tenhamos um natal melhor. Enquanto estamos sentados em frente a uma mesa farta, rodeados dos nossos familiares, perto da árvores de natal plantada nos embrulhos dourados e vemos na televisão o referido jantar olhamos uns para os outros e sentimos que fizemos o nosso deves. Já sentimos aquele sentimento de natal. Pena.
Mas na realidade não é de pena que se trata. Do que estamos a falar na realidade é de prazer e riso. O que se passa na realidade é nos sentimos bem por estar em frente daquela mesa e não partilhar aquele bacalhau escurecido com aqueles que cheiram mal, que ficam mal em qualquer cidade mas que lá existem.
Quando colocamos a garfada de bacalhau na boca ao mesmo tempo que a imagem “daqueles” se apresenta o que sentimos é vitória. Não somos nós que lá estamos, e por isso mesmo somos infinitamente superiores.

É toda esta hipocrisia que me inflige este sentimento de revolta por esta altura do ano. É ver que todos desejamos convictamente um Bom Natal, quando não é nada daquilo que queremos dizer. O que me faz transbordar de raiva é todos fingirmos uma época especial, quando na realidade todos sabemos que só servirá para cada um se tentar sobrepor ao outro. É este jogo do “finjo melhor que tu” que me draga qualquer crença de um qualquer sentimento natalício.
Mas não é o Homem um ser fingidor? Pois bem...
Que seja um bom natal para todos.

Ahh... Lembrei-me, vou também desejar um bom natal a todos àqueles que nada terão o que comer, àqueles que ninguém terão para os confortar. Como é óbvio mesmo para esses, que mesmo sem nada para comer ou ninguém para conversar, esta época será melhor. Pelo menos é isso que eu vejo (=penso). E se assim me sinto bem para quê mudar?

Enforquem o Pai Natal e deitem o menino Jesus à lareira. É este o verdadeiro acto natalício.

terça-feira, dezembro 23, 2003

|

PRIVACIDADE GENÉTICA

Todos nós possuímos um genoma que é responsável em grande parte por aquilo que nós somos. Mas no entanto, tirando pequenas variações, o genoma apresenta só algumas modificações de pessoa para pessoa. Assim sendo podemos concluir que o genoma é uma pertença da humanidade. Contrariamente a este pressuposto encontram-se algumas ideias que vão em direcção contrária e com isso pretendem o patenteamento de genes e quiçá das proteínas que deles advêm. Deste modo a função bem como a sequência do gene passa a ser um produto de uma empresa que pode ser vendido como qualquer outro produto.
Apesar do que se diga, o gene nunca é uma criação, é sempre uma descoberta, ou seja, todos nós carregamos com os genes já descobertos e aqueles que irão ser ainda descobertos no futuro. Assim como se pode vender algo que todos nós já possuímos?
Por outro lado encontra-mos outra problemática relacionada comoa informação que pode ser obtida através dos genes. De um modo relativamente simples, a partir de uma análise genética pode ser obtida informação que poderá indicar para predisposições dos indivíduos para certas doenças (cancro, obesidade, etc.). No recrutamento dos seus empregados, certas empresas começam já a fazer um rasteio genético para verificar que os empregados escolhidos não irão representar despesas acrescidas, por exemplo, por pedidos de baixa devido a doença. Para além das empresas, as agências de seguros são outro tipo de empresa a que a informação genética é muito cara. Ou seja, antes de realizar um contrato de seguro é pedida uma análise genética, para deste modo se verificar se é viável a realização da apólice. Será Justo?

segunda-feira, dezembro 22, 2003

|

PRIVACIDADE

O conceito de privacidade, tem ao longo do tempo vindo a ganhar uma importância que quase nos escapa. Para verificar isso basta olhar para a evolução da arquitectura, em que rapidamente se podem constatar um direccionamento para uma maior complexidade na estrutura final da habitação com o aparecimento de um maior número de divisões. É assim fácil a verificação da evolução desde a grande divisão ampla que era utilizada pelos antepassados do Homem até às habitações actuais quais com labirintos constituídos pelas várias divisões. Este aumento da complexidade do local onde se habita reflecte a necessidade primeiro da especialização das divisões, por exemplo a cozinha ou o quarto, mas também a necessidade de recolhimento, de privacidade. Assim, a privacidade parece ser definida como um espaço onde nos possamos sentir à vontade e que seja só nosso ate que o queiramos partilhar.
Em paralelo com o conceito de privacidade física, o exemplo da casa, existe também o conceito de privacidade pessoal, ou seja, quer queira-mos ou não existe sempre uma parte de nós que é completamente acessível a todos, outra parte que só a alguns revela-mos e por fim ainda outra parte que guardamos só para nós, que é privada.
No entanto além dos tipos de privacidade atrás descritos, outros conceitos de privacidade podem ser descritos, por exemplo a privacidade do casal, do filho, etc.
Apesar de haver tantas formas de privacidade gostaria de abordar fundamentalmente duas abordagens, por um lado fazer um olhar sociológico e por outro meter uma colherada de privacidade científica.
Como referi anteriormente erguem-se muros cada vez mais altos de modo a proteger a nossa privacidade, mas por outro lado estabelecem-se estratégias mais elaboradas para tentar ultrapassar essas barreiras. Parece assim que se estabelece como que um jogo entre a tentativa de nos esconder-mos face aos olhos do outro e um esforço em sentido contrário que o outro faz na tentativa de romper essa barreira. Hoje em dia é fácil constatar que a nossa privacidade porta fora fica muito reduzida pois a partir do momento que estamos num espaço público, estaremos certamente a ser alvo de vigilância, por câmaras mais ou menos presentes por onde se escondem olhos por nós antes vistos que nos seguem constantemente. Ou seja, de momento perdeu-se a privacidade pública, que poderá ser compreensível face à necessidade de segurança comum, sendo este o meio de controlar de um modo célere qualquer distúrbio que possa acontecer. Deste modo pode-se consentir este tipo de violação à nossa privacidade como um preço a pagar pela a nossa segurança.
Por outro lado a tentativa de furar a privacidade pessoal é tentada a todo o momento, mais que isso é aliciada. A pessoa parece que é impelida para tentar saber e controlar o que o outro faz, indo de encontro à relação que existe entre informação e poder, ou seja, quanto mais souber sobre o outro mais poder terei sobre ele. Quem nunca ouviu ou mesmo experimentou, os olhares mais ou menos discretos das “velhotas” por de trás das janelas a verem o que se passa na porta da vizinha. O que fará essa “velhota” levantar-se do seu descanso para ir ver o que se passa do outro lado da janela? Porque se interessará a “velhota” pelo o que se passa em porta alheia? Acho que se podem propor várias respostas, mas a mais simples, do meu ponto de vista, é o esvaziamento de que a pessoa da “velhota” representa. Ou seja, a busca incessante de que caracteriza o Homem, resume-se no caso da “velhota” até à porta da vizinha. A “velhota” desprovida de um sentido de vida realmente válido, cinge o seu mundo ao meio que a rodeia para nele se poder vangloriar através de uma pseudo-moralização que decerto irá ser partilhada com outra(s) “velhotas. No entanto penso que todos possuímos um pouco dessa “velhota”, pois todos sabemos que vivemos em mundos mais ou menos pequenos e por isso sentimos essa necessidade de saber o que o nosso vizinho está a fazer, ou seja, sentimo-nos tentados a quebrar a barreira da sua privacidade para assim satisfazer a nossa necessidade.
Quem tem tirado o maior partido de toda esta necessidade de experimentar quebrar a privacidade alheia foram sem dúvida os mass media, em especial a televisão. No princípio a curiosidade alheia recaía sobre aquelas pessoas que, por qualquer razão, se tornavam do conhecimento público, e assim inevitavelmente teriam de tornar disponível a sua vida para o conhecimento generalizado do resto das pessoas, era o preço da fama. No entanto, com o andar do tempo, os “famosos” não chegavam, era preciso mais, e foi assim que foram criados os “reality shows”. Adaptações das clássicas telenovelas, mas desta vez o argumento não estava escrito (ou talvez não...). Agora já valia tudo, e quanto mais valesse mais vendia. A vida das pessoas é seguida continuamente para assim se podem deliciar aqueles que não conseguem preencher o seu vazio que constitui as suas vidas. É a degradação completa do estatuto da privacidade, quase se pode dizer que é a degradação da civilização. Pois é engraçado reparar que o aumento da privacidade aumenta com os padrões de civilização, mas que ao mesmo tempo a necessidade de romper com essa barreira cresce ao mesmo ritmo.

sexta-feira, dezembro 19, 2003

|

INSUBURDINAÇÃO INTELECTUAL...
...UM MEIO DE VIDA


Toda a vida nos é oferecida desde o princípio, como um manancial de possibilidades que se estendem para lá de um horizonte que para nós mais parece infinito. No entanto, pela mesma altura que é exposta a grandiosidade daquilo que poderá ser a vida, são-nos impostos limites quase constantemente sobre quase tudo.
Assim, a necessidade de liberdade nasce naturalmente e um plano de fuga desta pseudo-prisão assola o pensamento de quase todos nós, com mais ou menos intensidade.
Após a tomada de consciência de que não somos verdadeiramente livres, vem a derradeira opção a fazer. Tomar este facto como um verdadeiro problema, ou por outro lado, renegá-lo para o plano das coisas supérfluas e desnecessárias de pensamento são as opções primárias com que nos deparamos.
Para o grupo que é constituído por aqueles que optam pela negação desta proposta adquirida por uma reflexão simples, o problema fica resolvido desde de logo, e é a entrega total à alienação imposta e depois, às limitações que daí advêm consequentes das auto limitações, ou seja, o fechamento linear com o tempo de todas as saídas do pensamento, que acabará inevitavelmente no atrofio intelectual visto de um ângulo mais abrangente. No entanto para aqueles para os quais o problema surge sob a forma de questão, pois não é possível negar a naturalidade pela qual emerge a consciencialização da limitação inerente à condição humana, uma resposta impõe-se.
A insubordinação intelectual, que à partida pode parecer um absurdo, pode tornar-se numa resposta primária para o problema fundamental que é moldado pela limitação já referida. A busca de um plano que seja o mais próximo possível da liberdade total, ou seja, da infinidade, leva-nos a uma resposta básica e acessível a todos, o pensamento ou a atitude intelectual perante os factos que nos são apresentados constantemente pelo meio que nos rodeia.
O conhecimento da própria limitação, que por conseguinte se estende a todo o Homem, pode constituir uma vantagem, já que aqueles para os quais não existe noção da sua limitação, jogarão na vida confiantes de que nada os poderá travar, e a sua queda torna-se por demais evidente, mesmo que o próprio não consiga se aperceber do que está a acontecer. Por esta razão, a virtude da humildade terá de ser imposta. O conhecimento da limitação terá de ser utilizado para compreender e justificar as atitudes altivas do Outro. A simples visualização do labirinto finito em que o Outro se encontra, não pode ser empregue para o pressionar sobre as suas paredes.
Perante a situação posta, uma posição moral impõe-se. Pressupondo que a atitude de indiferença do Outro perante a limitação, associada a uma acção que contraria o conhecimento que é aferido pelas estruturas mais simples do discernimento, uma tentativa de dar a conhecer a realidade vigente ao Outro torna-se espontânea, por outro lado, poderemos cair na tentação de simplesmente ignorar a atitude do Outro. Nenhuma desta atitudes trará consigo um acto de verdadeira moral. Pois se por um lado tentarmos dar a conhecer a realidade por nós apreendida, estaremos a contrariar a vontade do Outro; Por outro se ignorarmos o facto de que o Outro se encontra a viver num estado afastado da realidade, não poderemos escapar às garras cruéis da nossa consciência, que aliada à humildade, nos empurra a tudo fazer para reconduzir o Outro ao caminho da verdade. Esta é uma questão que teremos de solucionar consoante o Outro, conforme a sua disposição, abertura ou mesmo discernimento mostrado para receber uma nova visão de um novo mundo que desconhece.

quarta-feira, dezembro 17, 2003

|

A vida decorre normalmente. Todos os dias morrem pessoas de maneiras estúpidas e devido à estupidez humana. No entanto andamos todos preocupados em comprar prendas de natal.
Bem sei que isto é uma banalidade, mas é só para lembrar. É frequente esquecermo-nos das banalidades com o pretexto de serem precisamente banalidades.

terça-feira, dezembro 16, 2003

|

A última semana tem sido do mais surpreendente. A minha vida rege-se pela ausência de deus. Os valores morais pelos os quais me rejo são os da liberdade e daí o respeito obrigatório pelos outros. Na semana passada fui convidado para uma mesa redonda que ocorreu numa casa declaradamente católica (aliás é regida por padres jesuítas, está tudo dito) sobre a questão do Ateísmo. Já se está a ver. Um ateu numa casa católica, assumidamente ateu perante uma plateia predominantemente católica. Bom, mas fui sem medo. Convicto da inexistência de deus e afins, mas sabia que não iria ser uma discussão equilibrada. Eu estava quase sozinho num dos pratos da balança.
Contei a história do meu caminho para o ateísmo, sim porque já fui crente, percorri todo o caminho, catequese, profissão de fé, crisma, etc.
A discussão decorreu como já se está a imaginar. Embora num tom cordial a discordância foi quase geral, mas ouvi coisas espantosas do género: “deus é humano”, “deus dá-nos a possibilidade de ser perfeito”, “deus é a razão da nossa existência”, “ se não existir deus para que serve a nossa existência”, etc., etc..
Da minha pequena história o que gerou mais comentários foi o facto de assumir que se deus é perfeito (segundo a própria definição de deus) então não podia ter criado o Homem (coisa imperfeita) logo deus não existe (digo isto de uma forma simplificada) e o outro assunto de que falei (entre outros) foi sugerir que para a existência humana, uma posição crente seria mais confortável.
De todas as opiniões que ouvi a que mais me surpreendeu foi a do próprio Pde jesuíta que estava a presidir à mesa redonda.
A primeira foi referente ao facto de eu ter pressuposto que deus era perfeito. A resposta dele a esta afirmação foi que deus não era perfeito, aliás, que deus era cheio de perfeito. Não me foi dado o direito de resposta, mas a pergunta que eu teria feito seria: Se tenho que acreditar em algo, que à priori é imperfeito, prefiro acreditar no Homem.
A segunda opinião do Pde que me surpreendeu foi a resposta à questão da confortabilidade de ser crente. E aqui houve duas coisas que ele disse dignas de nota. 1) Se nos sentimos bem quando cremos em deus então é porque ele existe (esta arrasou-me, nem me dei ao trabalho de tentar rebater); 2) Ser crente é uma posição bastante desconfortável, lembrem-se daqueles que morreram na arena pela fé. Aqui não resisti e tive de perguntar num ápice: E aqueles que morreram na arena (sentido metafórico) sem crerem em nada? Aí o pde fez uma cara de surpresa e nada respondeu.

Realmente quando penso nisto sou cada vez mais colado a Feuerbach. O Homem para se livrar do real refugia-se no ideal.

Na próxima entrada não me posso esquecer de voz falar do Varão D’Holbach, de quem veio a inspiração para o nome deste blog.

segunda-feira, dezembro 15, 2003

|

CAPÍTULO I

É completamente manhã, mas nem por isso o meu despertador deixa de tocar.
Não tenho vontade nenhuma de sair do conforto que esta cama me dá. Não só pelo toque que os cobertores quentes transmitem, mas também pela protecção que me conferem perante todas as armadilhas que me esperam.
Ligo a luz do candeeiro da mesinha de cabeceira que fica logo ali ao lado da cama e começo a despertar para mais um dia... Tudo estava na mesma, tal como deixara no dia anterior. As pesadas janelas de madeira impediam que a luz, ainda ténue, de entrar. No meio do quarto encontrava-se a cama onde estava, uma cama de casal robusta, madeira de pinho e à cabeceira uma lombada maciça de madeira trabalhada enquanto que no fundo saiam dois espigões de cada lado, como que a salientar a robustez desta, ao fundo podia ver a mesa onde trabalho, com o seu candeeiro, umas folhas ao acaso e uma tantas canetas na mesma ordem. - Arrumação não é o meu forte - Pensei. Levantei-me, e logo dei de caras comigo próprio no espelho que se encontrava sobre a cómoda onde guardo parte da roupa, pois a restante encontra-se no roupeiro que está firmemente colocado ao lado da janela. Vagarosamente, fui abrir a janela e aí podia ver que a cidade ainda não tinha acordado. Num acto de desespero de afastar o sono, abri a janela esperando que a brisa fresca da madrugada me acordasse de vez, mas qual não foi o meu espanto, quando a aragem que me bafejou era quente e confortável - Que estranho - Bom, se não me desperta, pelo menos dá-me vontade de sair. E fui direito à casa de banho, que se encontrava por trás de uma porta do quarto que não a da saída, essa ficava ao lado da cómoda, esta era ao lado do roupeiro.
Depois do ritual da higiene matinal e de me vestir, esperava-me, tal como já era habitual, um pequeno almoço simples mas eficiente, leite tingido de café e uma torrada, sempre preparado pela tão ternurenta D. Gertrudes. Esta era a minha senhoria, senhora simpática, velha com o peso dos anos já a abaterem-se sobre os seus ombros, que a sua curvatura não escondia. Os seus bons dias eram sempre acompanhados por um sorriso, daqueles que nos fazem lembrar aquelas avózinhas dos filmes, se calhar é por isso que sempre me senti bemvindo a esta casa.
- Bom dia Sr. António, parece que vamos ter aí um forno hoje, a ver pela madrugada. - Disse a D. Gertrudes começando a encher a chávena de leite quente. - Sim é verdade, mas até que é bom, assim nem apetece estar na cama. -Respondi-lhe ao sentar-me.
-Agora reparo - dizia a D. Gertrudes completando a chávena com café - O Sr. hoje madrugou, acho que está meia hora adiantado ao que é costume, ao que se deve a proeza, algum milagre, hoje até se sentou, valham-me deus. Então onde está a corrida matinal? - Questionou a D. Gertrudes. - Pois é, hoje com este tempo quente nem me custou sair da cama, por isso aqui estou, esperto que nem uma alface, para a aventura do dia-a-dia.
Passado algum tempo, depois de ter tomado aquela refeição calmamente, o que já há muito tempo não acontecia, levantei-me e pressenti que algo estava diferente, mas não conseguia perceber exactamente o quê, mas no entanto continuava a tentar perceber a razão daquela diferença que me estava a afectar... percebi então, a D. Gertrudes tinha o cabelo solto. Eu desde há muito tempo que estava naquele quarto na casa desta senhora, que depois passou de quarto à casa toda, pois eram muitos os serões que eu passava com ela na pequena sala de jantar a conversar das mais variadas coisas, assuntos que brotavam da televisão que se encontrava no canto, entre a mesa e a parede. Então podia-mos falar de tudo um pouco, desde o tempo, até à política da mais refinada, como é claro, a D. Gertrudes, mulher de grande força, viúva desde já algum tempo, sempre habituada à força do trabalho pelas suas próprias mãos, não era propriamente uma entendida nos assuntos que por vezes tratava-mos, mas tinha uma arma poderosa, a sua opinião, que por vezes na sua ignorância, travava argumentações dignas do mais elevado deputado na assembleia da nossa república. Mas aquela diferença matinal intrigou-me, pois nunca a tinha visto em condição semelhante, o que me levou a questionar: - Mas D. Gertrudes, agora reparo, soltou o seu cabelo. Ao que se deve? - Mas a D. Gertrudes, devolvendo-me mais um dos seus quase maternos sorrisos respondeu. - Não é nada, Sr. António, é que lavei o cabelo e está a secar. o Sr. é que nunca madruga, e confesso que hoje, contrariamente ao Sr. me atrasei, o que me levou a estar aqui nestes preparos, mas nada demais. - Mas olhe que lhe fica bem - retornei - quem sabe se assim não voltaria a encontrar um príncipe. Mas a D. Gertrudes, agora com um ar mais séria devolveu.- Não, Sr. António, ao meu Alfredo já ninguém tira o lugar, e para além disso quem já quereria uma carcaça desta, já carcomida pelo tempo, pois esse não deixa ninguém indiferente, não Sr. António, por mim, já só penso em viver bem e nada mais para além disso, o mundo já nada tem para me dar de novo, para mim já nada é novidade, nem todas essas coisas que às vezes aparecem na televisão, para mim já são coisas do demo - e persignando-se continuou - para mim o mundo está aqui nesta casa, a praça, a loja da D. Maria e pouco mais, e para dizer a verdade é quanto eu preciso, para quê mais? Se já sou feliz quanto me baste. - E abanando com as mãos continuo - mas não se prenda com estas minhas palermices, olhe apresse o seu pequeno almoço, pois daqui a um bocado, passa a estar atrasado tal qual todos os dias eu conheço.

A Felicidade
A felicidade é o sentimento, de todos que eu conheço o mais difícil de ser atingido, mas no entanto, quase todas as pessoas o desejam, mesmo sabendo à partida que nunca chegarão a alcançar tamanha meta. Por vezes oiço alguém exclamar: “Que felicidade...”. Mas, depois já nada resta, a felicidade pode ser resumida a um momento, e nada mais, posso ser feliz agora, e daqui a nada dessa felicidade já nada resta, foi-se como que por magia. Por vezes as pessoas auto declamam a sua felicidade, confundindo esse sentimento com outra coisa. A felicidade é uma meta, um objectivo, mas muito relativo, mais um daqueles sentimentos relativos que ninguém consegue definir. Mas a felicidade é algo a atingir, não para ser estabelecida como um presente, pensa-se em felicidade como algo futuro, e para isso despendemos todas as nossas energias se necessário e mais algumas que vamos buscar a não sei onde, tudo em prol da nossa felicidade. Para algumas pessoas. pode-se ser feliz, independentemente de qualquer outras pessoas, para outros seres, isso já se torna difícil, pois a felicidade passa obrigatoriamente pelas outras pessoas. A felicidade pode ser vista como matéria, mas também pode ser vistas como espírito, para isso basta entrar numa igreja de qualquer credo, e logo podemos deparar com uma felicidade a atingir que se relaciona obrigatoriamente com o espírito. Mas nada disso é muito difícil de entender, como se poderia ser feliz completamente, se a nossa alma não estiver bem? Como poderemos sentir prazer corporal se a alma estiver a sangrar? Penso que neste ponto nenhuma dúvida resta.
Mas, a felicidade, tal como todos os sentimentos referidos como humanos, são muito complicados, pois o que pode para uns ser a mais plena das felicidades, pode para outros ser a mais árdua da dor a ultrapassar, quantos não conhecemos, que para encontrarem a sua felicidade anseiam pela dor? E outros que perante esta fogem e quando esta os alcançam os atormenta sem piedade. Quantos é que chegam à felicidade simplesmente pelo facto de se encontrarem vivos, e para outros esse é o facto de maior infelicidade.

A felicidade é um facto para cada um, embora por muito difícil seja de entender, a minha felicidade não é a tua. Se calhar, é por muitos de nós ainda não se ter apercebido desta razão que quase todos nós nos declaramos infelizes.

|

[ Mon Dec 15, 09:45:32 AM | Varão de Holbster | edit ]
Hoje só vou escrever para vos recomendar um blog:
http://zogoiby.blogspot.com

|

Sim, está tudo certo.
Está tudo perfeitamente certo.
O pior é que está tudo errado.
Bem sei que esta casa é pintada de cinzento
Bem sei qual é o nome desta casa -
Não sei, mas poderei saber, como está avaliada,
Nessas oficinas de impostos que existem, que {?}
Bem sei, bem sei.
Mas o pior é que há almas aí dentro
E a Tesouraria das Finanças não conseguiu livrar
A vizinha do lado de lhe morrer o filho.
A Repartição de não sei o quê não pôde evitar
Que o marido da vizinha do andar mais acima lhe
{fugisse com a cunhada...
Mas, está claro, está tudo certo...
E, excepto estar errado, é assim mesmo, está certo...

Fernando Pessoa 5-3-1935
in “Novas Poesias Inéditas”

quinta-feira, dezembro 11, 2003

|

É mais forte do que eu. Vou falar sobre o Natal. Vou falar sobre esse movimento consumista de origem capitalista.
Todos nós começamos a ficar um pouco irritados quando nos princí­pios de Novemro já temos de gramar com a publicidade referente ao Natal. Um pouco mais tarde começam as festas denominadas de Natal, como são o Natal dos Hospitais, o natal do pobrezinho do deficiente mental, o natal daquela famí­lia que não tem nada para comer, etc., etc.. Desta forma as pessoas lavam-se de uma possí­vel responsailidade de que o mundo das outras poderia ser melhor com a sua ajuda. Deste modo, passam uma tarde em frente do televisor, que debita uma sequência de artista de topo, cantando lí­ricas tão eloquentes, como por exemplo, "se queres haviar tens que saltar", ou ainda "coitadinho, mas eu tenho um fraquinho...". Elas (as pessoas) veêm o natal dos hospitais e ficam bem, cumprirm a sua missão de natal. Dsculpem-me, engano-me. Falta-lhes a missão crucial que marca o natal. As compras. Natal é sinónimo de compras. Durante esta época é como se cintilasse na cabeça das pessoas um apelo incontornável para o consumo, pode-se não ter dinheiro para comer, mas para comprar uma procaria qualquer para não se ficar mal visto no seio do grupo de pessoas que nos roeiam, existe sempre dinheiro.
Tudo isto tresanda a hipocrisia. Mas isso já não sabemos. O que fazemos é entrar alegremente no jogo fingindo que de nada nos apercebemos, e assim somos felizes, pelo menos aos olhos dos outros.
Feliz natal e boas compras....